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Lumen Gentium capitulo 08


  1. Eduardo Pacheco Freitas (epfreitas@live.com)¹

    RESUMO: O presente artigo procura estudar a visão dos fiéis e da Igreja em relação à  Virgem Maria e ao culto mariano nos séculos XIX e XX. Para isto é feita a análise dos momentos históricos onde ocorreram as proclamações dos dogmas da Imaculada Conceição (1854) e da Assunção (1950). De igual maneira, são analisados estes mesmos aspectos em relação ao Concílio Vaticano II (1964), a partir do capítulo VIII do documento Lumen Gentium, que trata exclusivamente do papel de Maria no contexto da Igreja e no mistério da revelação de Cristo. A metodologia do trabalho busca dar enfoquehistoriográfico, identificando as relações possíveis e existentes entre estes movimentos mariológicos, incluída a temática das aparições e o contexto histórico onde ocorreram.

    PALAVRAS-CHAVE: Mariologia. Dogmas marianos. História da Igreja. Aparições. Concílio Vaticano II.Lumen Gentium.

    RESUMEN: El presente artículo procura estudiar la visión de los fieles y de la Iglesia en relación a la Virgen María y al culto mariano en los siglos XIX y XX. Para esto se hace el análisis de los momentos históricos dónde han ocurrido las proclamaciones de los dogmas de la Inmaculada Concepción (1854) y de la Asunción (1950). De igual manera, se analizan estos mismos aspectos en relación al Concilio Vaticano II (1964), a partir del documento Lumen Gentium, capítulo VIII, que trata exclusivamente del papel de María en el contexto de la Iglesia y en el misterio de la revelación de Cristo. La metodología del trabajo buscará dar enfoque historiográfico, identificando las relaciones posibles y existentes entre estos movimientos mariológicos, incluida la temática de las apariciones y el contexto histórico dónde han ocurrido.
    PALAVRAS CLAVE: Mariología. Dogmas marianos. Historia de la Iglesia. Apariciones. Concilio Vaticano II. Lumen Gentium.



    1.   INTRODUÇÃO

    Durante a história de mais de dois mil anos da Igreja foram estabelecidos quatro dogmas marianos, ou seja, doutrinas oficiais referentes a Maria. São eles: Maternidade Divina, Virgindade Perpétua, Imaculada Conceição e Assunção.
    Os dois primeiros dogmas datam dos primórdios da Igreja e são considerados como dogmas ecumênicos pois seriam aceitos por toda a cristandade, independentemente das divisões de igrejas que ocorreram, sobretudo após o Grande Cisma do Oriente (1054) e após a Reforma Protestante (1517).
    A Maternidade Divina de Maria foi primeiramente discutida no concílio de Éfeso (431) onde a questão central girava em torno da afirmação ou negação do título Theotokos (mãe de Deus) e posteriormente teve sua reflexão amadurecida no concílio da Calcedônia (451) onde se definiu solenemente a respeito do caráter divinal da maternidade de Maria.
    Já o dogma relativo à Virgindade Perpétua de Maria foi reconhecido ao término do último período patrístico no concílio Constantinopolitano II no ano de 553.
    No entanto, os dois últimos dogmas proclamados pela Igreja ocorreram em um espaço de menos de cem anos entre os séculos XIX e XX. O dogma da Imaculada Conceição proclamado pelo Papa Pio IX em 08/12/1854 e o o dogma da Assunção proclamado pelo Papa Pio XII em 01/11/1950.
    A partir desta constatação podemos concluir que em um período de quase mil e quinhentos anos existiram oficialmente apenas dois dogmas marianos, ao passo que em um período de somente 96 anos, entre 1854 e 1950, mais dois dogmas foram oficialmente proclamados pela Igreja Católica em relação à Virgem Maria. Acerca desta proximidade entre a proclamação de um dogma e outro, Pelikan (2000, p. 278-9) nos traz uma informação bastante reveladora:

    Na época da promulgação do dogma da imaculada concepção, em 1854, já se fazia sentir um extenso movimento articulado por vários representantes da Igreja católica romana, destinado a provocar uma definição correspondente com relação à doutrina da ascensão. Cento e noventa e cinco padres da Igreja que assistiam ao Concílio Vaticano I, de 1869-70, insistiam nesse ponto. A agitação política e eclesiástica que cercou esse concílio impediu tal definição.

    No entanto, estas decisões da Igreja foram amadurecidas longamente, como se pode apreender ao verificar-se o período de tempo entre os dois primeiros dogmas e os dois últimos. Em relação a este fato, o Dicionário de Mariologia diz que:

    Durante esse longo período, o desenvolvimento do dogma mariano caracterizou-se pelo progresso da reflexão sobre a imaculada conceição e sobre a assunção. São dois os aspectos desse processo: o primeiro é constituído pelas dificuldades que a reflexão teológica encontrou por causa da falta de fundamentos escriturísticos suficientemente válidos; o segundo pelo fato, de que, nesse campo, jamais se tratou de defender a ortodoxia contra heresias perigosas para a fé, mas simplesmente de gradual processo de esclarecimento dentro da própria igreja. (DICIONÁRIO DE MARIOLOGIA, 1995, p. 415)

    De acordo com este entendimento, o grande lapso de tempo que separa a proclamação dos dois primeiros dogmas da proclamação dos dois últimos tem sua origem no fato de que estes necessitaram de um processo muito mais lento de discussão e de amadurecimento, justamente pela sua maior complexidade e não somente a isto, mas pela própria complexidade estrutural da Igreja, que foi se tornando um organismo cada vez mais sofisticado ao longo dos séculos. Na época da Igreja primitiva, havia certa facilidade, apesar das inúmeras heresias, em se tomar decisões e espraiá-las para toda a cristandade, que ainda era mínima e simples. Com o passar do tempo e a crescente hierarquização do clero e a cada vez maior sofisticação administrativa e teológica da Igreja podemos imaginar que decisões de tal magnitude, como a promulgação de um novo dogma, tal como ocorreu com os novos dogmas marianos, tenham que passar por longos processos, intensos debates e revisões por diversas autoridades eclesiásticas.
    Em face a isto, podemos entender que:

    Tal processo, para a imaculada conceição mais do que para a assunção, não foi absolutamente linear e sofreu vicissitudes alternadas. Todavia, um olhar retrospectivo revela que o progresso no reconhecimento das verdades em questão foi constante. Como já dissemos, para essas duas verdades marianas, chegou-se à proclamação dogmática respectivamente em 1854 e em 1950. (DICIONÁRIO DE MARIOLOGIA, 1995, p. 415)

    Ou seja, houve um longo e refletido processo de gestação destes dois dogmas, através de caminhos tortuosos muitas vezes, porém constante, até a proclamação oficial de duas definições que desde os primórdios da Igreja já eram discutidas: a Imaculada Conceição e a Assunção de Maria.
    Devido estas condições, absolutamente idiossincráticas, do catolicismo e de sua estrutura teológica, podemos compreender que “o desenvolvimento dos dogmas marianos talvez seja o caso mais complexo de desenvolvimento dogmático no catolicismo.” (DICIONÁRIO DE MARIOLOGIA, 1995, p. 413)

    2.   SÉCULO XIX: O DOGMA DA IMACULADA CONCEIÇÃO

    O século XIX é um momento da história de Maria na Igreja que pode ser chamado triunfalista. Alguns autores classificam este concepção da imagem da Virgem de visão maximalista de Maria, na qual os fiéis teriam exagerado no papel e no culto de Nossa Senhora dentro da Igreja, dissociada da imagem de Cristo, quase como uma corredentora².
    Neste contexto é que foi proclamado o dogma da Imaculada Conceição, pelo Papa Pio IX em 08/12/1854. A data escolhida para a definição do dogma não foi um mero acaso. Desde a Idade Média já havia uma tradição de comemorar a festa da Imaculada Conceição a cada 8 de dezembro. Podemos afirmar, a partir deste fato, de que a noção de que Maria foi uma mulher privilegiada, livre da culpa do pecado original, já era algo corrente, ao menos na devoção popular.
    Há o respaldo de certa passagem bíblica, que desde os tempos patrísticos, foi interpretada neste sentido de atribuir a Maria a concepção livre de mácula. Quando do anúncio do nascimento de Jesus podemos ler em Lucas 1,28: “O anjo entrou onde ela estava e disse: ‘Alegra-te, cheia de graça!- O Senhor está contigo’”.
    Sobre a Imaculada Conceição, o Dicionário de Mariologia (1995, p. 600) diz, no sentido historiográfico que buscamos para este trabalho: “a imaculada conceição é um caso extremo da evolução dos dogmas. Do silêncio da Escritura e da mais antiga tradição, chega-se à definição dogmática de 1854, através de fases polêmicas e dramáticas.” É interessante notar que este caráter difícil de evolução, mas que não deixa de ser constante, permeia toda a história dos dogmas na igreja, de forma mais importante em relação aos dogmas marianos, que de acordo ainda com o Dicionário de Mariologia (1995, p. 600), já eram consagrados popularmente, porém sem o aval teológico oficial:

    Um fato claro se deduz do dogma da imaculada conceição: a precedência do sentido cristão popular, intuitivamente a favor do privilégio mariano, sobre a teologia há muito ondulante pró ou contra ele e sobre o magistério que só se pronuncia de forma definitiva em 1854.

    No entanto, é somente no século XIX que a Imaculada Conceição virá de fato a fazer parte do catecismo católico como uma revelação, em forma de dogma. Este fato pode ser analisado a partir de dois significados: 1) as mudanças dentro do seio da Igreja ocorrem de maneira lenta e são profundamente refletidas. Durante séculos se aventou, e até mesmo se comemorou popularmente, a hipótese de Maria ter sido concebida livre do pecado, com grandes teólogos aceitando e defendendo esta ideia, mas somente após muitos séculos é que ela de fato se tornou um dogma católico. 2) é inegável que neste processo houve o crescimento da imagem de Maria perante os fiéis e perante a Igreja, restando estabelecer ainda o que é causa e o que é efeito. Parecendo, com mais chances de ser verdade, que a proclamação do dogma é efeito de um momento triunfalista da teologia mariana dentro da Igreja.
    Segundo Leahy,
    Nos séculos XIX e XX, também o papel de Maria veio à tona de modo novo. Von Balthasar, por exemplo, recorda as definições marianas e as aparições. Com total humildade e salientando a graça de Deus todo-poderoso, Maria se manifestava nas aparições como o protótipo da Igreja , segundo o qual devemos ser modelados. As definições marianas da Imaculada Conceição (1854) e da Assunção (1950) exprimem a centralidade do papel de Maria em todo o plano da salvação. (2005, p. 40-1)

    Houve nesse período, portanto, uma grande valorização do papel de Maria, existindo quase uma centralização de sua figura dentro do catolicismo. É uma concepção que será seriamente afetada posteriormente com o advento do Concílio Vaticano II que coloca Maria, através do documento Lumen Gentium, “[...] no mistério de Cristo e da Igreja, e não num tratado à parte, como queriam os grupos conservadores. (MURAD, 2004, p. 15)

    3.   SÉCULO XX: O DOGMA DA ASSUNÇÃO

    No ano de 1950, pelo Papa Pio XII, foi proclamado através do documento Munificentissimus Deus,o dogma mariano referente à Assunção. De acordo com o Dicionário de Mariologia, este ato da Igreja

    […] não foi imprevisto ou arbitrário [...] além de concluir intenso período de estudos históricos e teológicos, realizados criticamente, que floresceram na igreja católica entre 1940 e 1950, ela coroou e proclamou uma fé há muito tempo professada universalmente pela igreja de todo o povo de Deus (1995, p. 173-4)

    Desde os primórdios da cristandade, apesar do silêncio das escrituras em referência ao destino final de Maria, houve o entendimento de que a Theotokos havia ascendido aos céus e ocupado seu lugar ao lado do Filho e de Deus. Em verdade, mais precisamente, a partir do século IV é que começam a aparecer as primeiras manifestações a respeito deste tema, e isto se explica porque é também neste período que inicia-se um delineamento mais seguro em relação aos problemas escatológicos.
    No século XX, portanto em torno de quase mil e seiscentos anos após as primeiras especulações teológicas a respeito da morte e do destino do corpo de Maria é que o Papa Pio XII, finalmente, é o sujeito desta proclamação profunda e, segundo alguns autores, de caráter divisionista entre as diversas igrejas cristãs. Afirma-se que esta definição dogmática apareceu justamente em “um momento no qual o doloroso e lento processo ecumênico começava a dar sinais de estar sanando velhos conflitos entre as Igrejas orientais e ocidentais” (PELIKAN, 2000, p. 276). É sabido que um forte distintivo do credo católico em relação às demais denominações cristãs é justamente a relação próxima e carinhosa com a figura da Virgem Maria. Neste sentido, Pelikan diz ainda que a proclamação do dogma pode ter afetado a evolução de uma relação de aproximação “até mesmo entre o protestantismo e o catolicismo romano” (PELIKAN, 2000, p. 276)
    Contudo, especificamente aos fiéis católicos, podemos afirmar que  o dogma foi a coroação de quase dois mil anos de teologia popular, que via na Assunção de Maria a comprovação exata e justificação perfeita do culto mariano. Mesmo com a ausência de fontes patrísticas e bíblicas em relação ao tema, o credo popular sempre foi no sentido de entender que Maria permaneceu íntegra em vida e íntegra após a morte. Não foi corrompida pelo pecado original, permaneceu em estado de virgindade perpétua e subiu aos céus não tendo seu corpo imaculado corrompido pelas consequências da morte terrena. Houve, desde muito tempo, a percepção, embora faltasse a autoridade das fontes, de que esta é uma verdade “adquirida pela fé da Igreja” (DICIONÁRIO DE MARIOLOGIA, 1995, p. 174) e que esta fé popular, baseada na tradição, corresponde a uma “segura revelação do Espírito Santo” (DICIONÁRIO DE MARIOLOGIA, 1995, p. 174) justamente pela fé em conjunto.
    Depois de 96 anos da proclamação do terceiro dogma mariano, era proclamada outra doutrina, semelhante no fato de quase sempre ter estado no culto popular; diferente por ter provocado um maior distanciamento entre a Igreja católica e as igrejas protestantes.

    4.   APARIÇÕES

    Um aspecto bastante importante nas discussões contemporâneas da Mariologia é a questão das aparições. Envoltas em polêmica, suscitam todo tipo de sentimentos, desde a negação completa até o exagero de culto nos locais onde Maria teria se apresentado aos homens. Na história da Igreja, incontáveis são as aparições da Santíssima Virgem, no entanto, somente cinco delas são devidamente aceitas pelo Vaticano, a saber³:

    1)    1531: Guadalupe, no México, ao índio Juan Diego;
    2)    1830: Paris, França, a Santa Catarina Labouré (Medalha milagrosa);
    3)    1846: La Salette, França, a Maximino Giraud e Melânia Cavat (aparece chorando);
    4)    1858: Lourdes, França, a Santa Bernadete Soubirous (A Imaculada Conceição aparece em uma gruta);
    5)    1917: Fátima, Portugal, Jacinta, Francisco e Lúcia, na Cova da Iria sob uma azinheira (árvore); (FERREIRA, 2000, p. 48)

    Logo percebemos algo bastante interessante nesta pequena lista das aparições que são reconhecidas pela Igreja: somente uma delas não ocorreu nos séculos XIX ou XX. A aparição de Guadalupe, no México, aconteceu no século XVI. Aqui podemos estabelecer uma relação importante acerca do crescimento da imagem da Virgem Maria nos séculos XIX e XX. Da mesma forma que dois dogmas foram proclamados nestes dois séculos, quatro, das cinco aparições reconhecidas pela Igreja, aconteceram no mesmo período. Três delas no século XIX e uma no século XX. Parece-nos um outro forte indicativo do papel que Maria representa nestes dois séculos.

    5. LUMEN GENTIUM – CAPÍTULO VIII

             Em Roma, a 21 de Novembro de 1964, foi publicada a constituição dogmática do Concílio Vaticano II intitulada Lumen Gentium (Luz dos Povos). Em seu oitavo capítulo reservou-se o espaço para definir, embora não de maneira fechada, conforme expressa o próprio documento[4], a relação que deve existir entre os fiéis e a Igreja com a Virgem Maria.
    Após o “maximalismo” e após o “minimalismo”, com este documento atingiu-se um caminho intermediário, onde “aos teólogos e pregadores da palavra de Deus, exorta-os instantemente a evitarem com cuidado, tanto um falso exagero como uma demasiada estreiteza na consideração da dignidade singular da Mãe de Deus” (LG, VIII, 67)
    A Igreja se manifesta de forma bastante clara, orientando no sentido de que o culto de Maria faz parte do credo católico, no entanto, não se deve nunca esquecer, que todo o poder de mediação e de intercessão da Virgem provém de Cristo. Diz o documento: “este culto, tal como sempre existiu na Igreja, embora inteiramente singular, difere essencialmente do culto de adoração, que se presta por igual ao Verbo encarnado, ao Pai e ao Espírito Santo, e favorece-o poderosamente” (LG, VIII, 66). Não se descarta de forma alguma a importância de Maria dentro do projeto salvífico, porém estabelece-se que seu culto é diferente daquele que o cristão deve prestar às pessoas da Trindade. Além de confirmar todos os dogmas anteriores, o documento aponta qual a origem do poder de mediação da Santíssima Virgem:

    Efectivamente, nenhuma criatura se pode equiparar ao Verbo encarnado e Redentor; mas, assim como o sacerdócio de Cristo é participado de diversos modos pelos ministros e pelo povo fiel, e assim como a bondade de Deus, sendo uma só, se difunde variamente pelos seres criados, assim também a mediação única do Redentor não exclui, antes suscita nas criaturas cooperações diversas, que participam dessa única fonte. Esta função subordinada de Maria, não hesita a Igreja em proclamá-la; sente-a constantemente e inculca-a aos fiéis, para mais intimamente aderirem, com esta ajuda materna, ao seu mediador e salvador. (LG, VIII, 62)

    Depois de se estabelecerem quatro dogmas a respeito de Maria e do culto oscilar entre posições “maximalistas” e posições “minimalistas” parece que a Igreja, com a confecção deste documento, conseguiu estabelecer de maneira bastante clara e objetiva qual a relação que os fiéis devem ter com Nossa Senhora. O caminho apontado é o caminho do equilíbrio.

            6. CONCLUSÃO


             Saltam aos olhos, em referência à mariologia e aos aspectos do culto mariano, alguns fatos que indicam uma relação renovada com Maria a partir de acontecimentos históricos ocorridos nos séculos XIX e XX.         Concluímos, ao término desta pesquisa, que, após estas duas centúrias supramencionadas, passou a existir uma nova imagem, eclesial e popular, de Maria, representada historicamente pelo advento do dogma da Imaculada Conceição, pelo dogma da Assunção e pelo Concílio Vaticano II. Devido este último, podemos afirmar que há uma definição bastante solene e clara em relação ao culto que os católicos devem prestar à Maria, através da promulgação do capítulo VIII do documento intitulado Lumen Gentium.         Há, ainda, a questão sempre polêmica das aparições de Maria.  Existe um fato importante e que merece atenção que é o da grande maioria daquelas aparições que são reconhecidas oficialmente pela Igreja, terem acontecido nos períodos abordados por este trabalho. Este é um dado significativo, tanto em relação aos estudos mariológicos, quanto em relação à percepção da figura de Maria no contexto católico mundial, sobretudo no século XIX, por ser o período que abarca a maior parte destes eventos.         Por fim, chegamos a conclusão de que nos séculos XIX e XX houve um crescimento importante da imagem de Maria, dentro da Igreja e entre os fiéis. Este crescimento foi quantitativo – como podemos verificar pelo número de aparições e pelo número de novos dogmas proclamados – e também quantitativo – devido ao melhor entendimento da relação que deve existir entre a Igreja e os fiéis com Maria, provocado pela normatização expressa no capítulo VIII da Lumen Gentium.



    REFERÊNCIAS
    BOFF, Clodovis. Mariologia social: o significado da Virgem para a sociedade. São Paulo: Paulus, 2006.
    ____________. Introdução à mariologia. Petrópolis: Vozes, 2004.
    Constituição dogmática Lumen Gentium. Disponível em: <http://www.vatican.va/archive/hist_councils/ii_vatican_council/documents/vat-ii_const_19641121_lumen-gentium_po.html>. Acesso em: 14/10/2011 
    FERREIRA, José Lélio Mendes. Maria: breve introdução à mariologia. Aparecida: Santuário, 2000.
    FIORES, Stefano de. MEO, Salvatore. Dicionário de Mariologia. São Paulo: Paulus, 1995.
    FRÖHLICH, Roland.  Curso básico de história da Igreja. São Paulo: Paulinas, 1987.
    HACKMANN, Geraldo Luiz Borges. Refletindo em torno dos dogmas marianos. Teocomunicação, Porto Alegre, v.34, n.146, 911-934, 2004. 
    LEAHY, Brendan. O princípio mariano na igreja. São Paulo: Cidade Nova, 2005. 
    MURAD, Afonso. Maria, toda de Deus e tão humana. São Paulo: Paulinas, 2004. 
    PELIKAN, Jaroslav. Maria através dos séculos. São Paulo: Cia. Das Letras, 2000.
    RUEDA, Basílio, Irmão. Um novo espaço para Maria. FTD, 1980.  




    1           Aluno de graduação do curso de História na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS).
    2             Cf. MURAD, 2004, p. 15.
    3            Além desta lista de aparições transcrita aqui, há uma outra no livro usado como referência onde constam dezenas de aparições não reconhecidas pela Igreja.
    4           “Não tem, contudo, intenção de propor toda a doutrina acerca de Maria, nem de dirimir as questões ainda não totalmente esclarecidas pelos teólogos. Conservam, por isso, os seus direitos as opiniões que nas escolas católicas livremente se propõem acerca daquela que na santa Igreja ocupa depois de Cristo o lugar mais elevado e também o mais próximo de nós (LG, VIII, 54).”

  2. O documento Lumen Gentium, promulgado pelo Papa Paulo VI em 21 de novembro de 1964 se trata de uma constituição dogmática e é um dos textos mais importantes do Concílio Vaticano II. No capítulo VIII deste documento é abordada a questão do culto mariano, estabelecendo-se então algumas diretrizes neste sentido e determinando, embora sem um caráter definitivo e fechado, o papel da Virgem no credo católico e dentro da Igreja, entendida como Corpo Místico de Cristo.

    De acordo com o texto, Deus com o objetivo de redenção do mundo, fez Seu Filho nascer de uma mulher, através do Espírito Santo, que proporcionou que esta mulher tivesse uma gestação e um parto normal, mesmo após sua concepção imaculada e permanecendo no estado virginal após o nascimento de Jesus. Devemos, portanto, além de venerar os santos, venerar esta Mãe incomparável, a Virgem Maria Mãe de Nosso Senhor Jesus Cristo.

    Por seu “vínculo estreito e indissolúvel” com Jesus, Maria pode ser considerada uma filha predileta, com vantagem sobre todas as outras criaturas, pois é verdadeiramente a Mãe dos membros da Igreja de Cristo, devido sua cooperação com o nascimento dos fiéis desta igreja. Maria, portanto, tem papel único dentro do corpo da Igreja e do projeto de salvação.

    Com base nestes entendimentos, o Concílio tem por objetivo esclarecer, com muito cuidado, o papel singular da Virgem e, da mesma forma, embora não tenha como pretensão lançar as bases definitivas de uma doutrina a respeito de Maria, deixar clara a relação que os fiéis devem manter com a Boa Mãe.

    O papel de Maria na “economia da Salvação” remonta às profecias que já se costuravam desde o Antigo Testamento, como em Gênesis (3,15), na vitória da mulher sobre a serpente e a Virgem que conceberá e dará a luz a Filho, conforme Is. (7,14) e Miq. (5, 2-3).

    Outro aspecto de suma importância relacionado à Virgem é o tema da Anunciação, que desde os Santos Padres, que se referiam à Maria como “toda santa” e “imune de toda a mancha de pecado” é debatido no seio da Igreja. De acordo com o entendimento expresso no documento Lumen GentiumMaria foi moldada pelo Espírito Santo e assim como uma mulher (Eva) contribuíra para a morte, outra mulher (Maria) traz para o mundo a própria Vida. Indica-se, ao nos aprofundarmos na questão da Anunciação, que Maria respondeu afirmativamente ao chamado de Deus e que ela não foi mero instrumento passivo, justamente por esta decisão de trazer ao mundo o Salvador, mostrando assim nitidamente a sua cooperação neste sentido que é baseada em sua fé e em seu amor.

    Como uma boa e zelosa mãe, Maria participou ativamente da infância de seu filho Jesus, mesmo antes de Seu nascimento, já como peregrina indo anunciar a Boa Nova a sua prima Isabel. Após o nascimento, apresenta com alegria o filho aos magos e pastores. Preocupada, procura o filho e o encontra no templo e ouve que o Filho estava “ocupado nas coisas de Seu Pai” e, mesmo sem entender estas palavras, aparentemente ríspidas em se tratando da resposta de um filho a sua mãe, as guarda com carinho no coração e medita a respeito.

    Na vida pública de Jesus e na Paixão, Maria aparece também em papel de destaque, ao participar do primeiro milagre de Cristo nas bodas de Canaã e também quando na pregação onde Cristo rompe com os laços de parentesco, passando de mãe, à discípula, guardando novamente e meditando a respeito das palavras do Filho.

    O documento desenvolve ainda o tema da Assunção, quando nos reporta que Maria ascendeu aos céus no trecho onde se diz que “terminado o curso da vida terrena, foi elevada ao céu em corpo e alma”.

    A respeito do caráter intercessor de Maria é definido que toda capacidade de mediação da Virgem vem dos méritos de Cristo e que esta capacidade de auxílio favorece a união imediata com o Salvador. E isto é entendido de maneira que nada tire nem acrescente às qualidades de único mediador de Cristo.

    Por tomar parte nos mistérios de Cristo justifica-se a veneração de Maria. É um culto diferente na essência, e por isso mesmo singular, da adoração em relação ao Pai, ao Filho e ao Espírito Santo. Este culto serve para que se glorifique ainda mais o Filho que é por quem tudo de fato existe. Evita-se o exagero da mesma maneira que se evita a falta de consideração em relação à Maria. Segue, em relação ao culto às imagens, os mesmos preceitos já estabelecidos em relação às imagens de Cristo e dos santos.

    Como conclusão, podemos afirmar que Maria é parte fundamental do credo católico, por fazer parte de maneira monumental do projeto salvífico da redenção; por ter concebido livre do pecado; por ter ascendido aos céus em corpo e alma; por ter sido a primeira a acreditar e dizer sim a Deus quando da vinda do Salvador e por ter permanecido em estado virginal após o nascimento de Jesus. A partir disto devemos considerar que Maria deve ser cultuada, não ocupando o lugar de Cristo, mas favorecendo a união dos fiéis com Ele e sendo a Boa Mãe da Igreja e de todos os cristãos.


    Eduardo Freitas
    epfreitas@live.com


  3. Maria é apresentada no evangelho de Lucas como aquela que foi a primeira discípula de Cristo e também como o exemplo maior para toda a cristandade, pois é aquela que ouve atentamente a palavra de Deus, com muita fé e a guarda, colocando em prática posteriormente.

    Ao perceber que havia sido escolhida para missão tão especial, trazer ao mundo o Salvador, Maria não recua e diz sim ao chamado de Deus, mesmo com a grande dificuldade inicial que poderia colocar dúvidas em sua cabeça a respeito deste acontecimento. Ela questiona, com propriedade, como poderia realizar obra de tal magnitude pois não havia realizado a conjunção carnal com nenhum homem. Mas, este é um dilema que logo é vencido, pois Maria compreende que para a vontade de Deus não existem limites.

    Desta forma, Maria confiou plenamente e disse sim ao projeto salvífico e torna-se referência.

    Com este exemplo, Maria se torna um guia para todo o cristão, pois foi justamente a primeira a acreditar na vinda do messias e que poderia trazê-lo ao mundo, ajudando em sua educação, o criando como uma boa mãe. É notória a observação de Santo Agostinho que diz que Maria concebeu Jesus primeiro em seu coração e depois em seu ventre.

    Ela sentiu-se chamada a participar desta magnífica obra e participou com toda a sua coragem, com toda a sua fé, tornando-se inclusive uma missionária, a primeira, pois enquanto levava Jesus em seu ventre já vai visitar sua parente Isabel e levar um pouco da graça de Deus que se derramara sobre sua pessoa bem-aventurada com o objetivo de dividir tamanha graça com a humanidade.

    Estas características demonstram claramente a visão do evangelista Lucas em relação à mulher Maria, esta que foi a escolhida para ser a mãe de Jesus. É uma atenta ouvinte da palavra de Deus, que guarda e frutifica esta mesma palavra. Faz memória a partir dos desígnios de Deus e dos ensinamentos de seu filho Jesus.

    Quando este faz o rompimento necessário com sua família terrena para mostrar quais os vínculos realmente importantes aos olhos de Deus e poder se dedicar integralmente ao anúncio do Reino de Deus, ela deixa de ser apenas a mãe de Jesus e passa a ser uma irmã, que está ali, depois de ter educado o filho, agora para aprender os preciosos ensinamentos daquele que veio para salvar a humanidade. E ela faz isto justamente ouvindo com atenção a Sua palavra e meditando profundamente a respeito dela, guardando-a dentro de si e levando adiante, assim como deve agir o verdadeiro discípulo de Cristo. Ela procura desvendar o sentido destas palavras, o que comprova sua determinação em compreendê-las a fundo para melhor segui-las. Ela é uma missionária que reflete acerca da palavra.

    Tão importante quanto estes aspectos da personalidade de Maria destacados por Lucas, não podemos nos esquecer do cântico Magnificat.

    Dada a importância que Lucas coloca em seu texto de mostrar a preferência de Deus pelos pobres vamos encontrar nesta passagem, atribuída à Maria, uma bela defesa, partida por uma serva fiel do Senhor, daqueles que são humildes e de que o Reino de Deus é mais facilmente atingido por eles. Maria, através do Magnificat, nos diz que as injustiças terão fim com Deus e que a fé é fundamental neste processo.

    Por tudo isto, podemos concluir que Maria é o exemplo acabado do seguidor de Cristo o qual devemos todos nos espelhar. Ela ouve atentamente, não somente ouvindo, mas escutando e guardando com carinho tudo em seu coração de mãe de Cristo e irmã dos cristãos, fazendo que estes ensinamentos frutifiquem ao longo da travessia de fé. Ao mesmo tempo, Maria é peregrina, leva esta palavra adiante, sai pelo mundo, como deve fazer o cristão, espalhando a palavra de Deus. E por fim, Maria indica a preferência de Deus pelos humildes e faz acreditar com mais força que as injustiças terão fim e os homens poderão viver irmanadamente.  

    Eduardo Freitas
    epfreitas@live.com

  4. Os membros da Sociedade de Maria são considerados como irmãos e filhos de Maria ao mesmo tempo. Há nesse entendimento uma característica primordial da Sociedade que é a de estabelecer uma riqueza enorme do relacionamento dos membros com a Boa Mãe. Inicialmente, Champagnat batizou os pertencentes à Sociedade como Pequenos Irmãos de Maria, após, a expressão que se tornou mais popular foi a de Irmãos Maristas. É importante destacar que o irmão Champagnat chamava carinhosamente a Sociedade de Maria como "a obra de Maria” que é dividida em três ramos: a) ramo masculino: os sacerdotes; b) ramo feminino: as Irmãs; c) ramo secular: a 3ª Ordem.

    Um aspecto muito interessante da história da Sociedade de Maria está nas diversas cartas escritas por Marcelino Champagnat. Nelas, está a expressão do amor sentido pela mãe de Deus, contido nas carinhosas referências que o irmão Marcelino faz à Virgem: Maria é qualificada, nestas cartas, como “boa”, “amável”, “terna”, “nossa boa Mãe”, “nossa Mãe comum” dentre outros adjetivos que reforçam os laços do membro da Sociedade com Nossa Senhora. 

    Como dito anteriormente, a Sociedade de Maria se divide em três ramos. Falaremos agora do ramo masculino. Fundado pelo Padre Colin, que priorizava o trabalho marista com aquelas populações marginalizadas, tais como presos, mendigos ou operários, é uma extensão da presença de Maria entre o povo. De acordo com o Padre Colin, a missão de Maria é que a misericórdia de Deus chegue a todos, por isto este caráter inclusivo do ramo masculino da Sociedade de Maria. 

    Já as irmãs maristas talvez não se caracterizem por um trabalho específico. No entanto, tem presença ao redor do mundo inteiro, atuando em relação às necessidades daqueles às quais são chamadas a servir. Sua inspiração em Maria se traduz através de “oração, simplicidade, compaixão, ternura e discrição”. 

    Finalmente, o ramo secular, que se trata de uma derivação do ramo dos Padres Maristas. 

    Concluímos, destacando a importância da Sociedade de Maria em promover uma relação afetuosa com “nossa boa Mãe” e salientando seu trabalho com os mais necessitados e em relação à educação de crianças em todo o mundo. 

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